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O STF e os arroubos às liberdades: Um problema de concepção social

O Judiciário hoje é o Poder que ameaça a democracia brasileira.


O Judiciário hoje é o Poder que ameaça a democracia brasileira? Esse questionamento parece ser central no embate político-ideológico entre a velha política da esquerda que possui forte presença nas instituições e academia, e a nova direita ascendente, que luta por um espaço social. Inicialmente a questão já parece falha e infundada. Afinal, como o Poder Judiciário, o julgador das leis da conhecida "Constituição Cidadã", fruto da luta por liberdade contra o regime militar, poderia ameaçar a democracia que o promoveu e o fez crescer como instituto julgador do Estado Democrático de Direito na sua instância final? Para as respostas, primeiro é preciso compreender o que são as liberdades dentro da Carta Magna de 1988 e seu contexto. Também vale observar como é nocivo e prejudicial marginalizar opiniões e ideias contrárias do convívio social, algo que pode incitar ruptura da ordem pelo grupo alijado.


Liberdades na Constituição Federal de 88 (CF/88)

SARLET e NETO (2017)¹ elencam uma série de incisos do art. 5º da Lei Máxima do país, para abordar que esses incisos não sofrem um esgotamento no rol, e tampouco carecem de proteção. Nesse sentido, precisa-se compreender o contexto do Poder Constituinte Originário, que era a saída de um regime que cometera arroubos e excessos no cerceamento das liberdades e garantias individuais. Mesmo com vasta consideração e abordagem ampla das liberdades no art. 5º, os autores citados, observa-se a relativização da liberdade quando determinam também os perigos do que chamam de "delitos de opinião".


Analisar o que traz essa ideia, é fundamental para o pensamento ponderado, e a questão importante em torno da liberdade aqui é a premissa de que se parte para constituição social. Via de regra a visão esquerdista é oriunda da Revolução Francesa e do Progressismo que encontra morada nas teorias pós-positivistas como Pós-Modernismo e Construtivismo. A ideia de "bom selvagem" como na visão Rousseauniana é o início de tudo, na qual os homens são naturalmente bons e corrompidos na sociedade. Logo precisam de um Estado que dite regras em vivência. Porém há as visões mais extremistas, que abordam de forma jacobina ao querer sufocar ou eliminar quem ameace a sua visão de sociedade ou de "democracia" e "pluralidade". Aqui, o pós-positivismo atua relativizando tanto o poder estatal, quanto as liberdades individuais que podem impedir a atuação do Estado no controle social.


Já a direita observa mais como Kant, um homem racional que se entrelaça socialmente de forma pragmática, por proteção, mas desejando minimamente a intervenção do contrato-social nas suas escolhas individuais. Com base mais positivista, os princípios e valores são fundamentais para ditar as regras. As liberdades individuais são inalienáveis como princípio, e não como meio, portanto não há o que se relativizar. Aqui, observar o Estado como servidor do indivíduo, e não como garantidor deste é a premissa que divide a ideia de liberdade.


Como dito inicialmente, o contexto da criação da CF/88 é fundamental para definir sua visão e interpretação. A Constituição foi elaborada, em sua maioria por amantes de Rosseau e progressistas que viam a oportunidade de promover as chamadas "minorias" sociais e usar o Estado para garantir a segurança e o bem-estar social de forma intervencionista na sociedade, e compensar as desigualdades sociais. Basta observar os partidos de esquerda e centro-esquerda que dominaram o cenário da Nova República como PT, PSDB, PDT, PMDB, PFL (atual DEM) e o bloco do centrão que surgiu à época como uma força moderadora e pragmática do ofício político.


Observa-se que na Constituinte não se contemplou a direita, praticamente inexistente como força política. O único candidato de direita à Presidência, que permaneceu ao longo dos anos 1990 e início dos anos 2000 foi Enéas Carneiro, o qual sempre era considerado meio lunático, sem carisma e sem condições para chefiar a nação. Esse alijamento do cenário político foi proposital, dentro da lógica jacobina de petistas e comunistas mais radicais, e vantajoso para os partidos sociais-democratas que se venderam como "oposição à esquerda". Assim, nasceu o mecanismo denunciado pelo canal de documentários, Brasil Paralelo, conhecido como: Teatro das Tesouras.


Com a esquerda hegemônica, a ideia de liberdade que foi fomentada nas academias e nas jurisprudências é a de que as liberdades podem ser limitadas, principalmente no caso de "ameaças ao Estado Democrático de Direito". Assim, opiniões vistas como "perigosas" ou, nas palavras de SARLET e NETO (2017), os "delitos de opiniões" podem acontecer quando se provoque ou incite uma ruptura com o atual Poder Constituinte. Porém a linha entre evocar o direito de discordar inclusive de trechos da Constituição, ou da ordem hegemônica instaurada (de forma urbana), e a interpretação de palavras como ações perigosas ou "delitos de opinião" é extremamente tênue. E é isso que está acontecendo atualmente com a ascensão da direita verdadeira no debate político.


A Direita precisa ser aceita, ou ocorrerá uma ruptura

Um exercício de raciocínio básico explica o que acontece quando se marginaliza um grupo social. Ao resgatar a história do séc. XX, há exemplos fartos e tristes do que acontece com a marginalização política de grupos. O Nazismo alemão impedia judeus de terem seus negócios inicialmente colocando os soldados da SD na entrada dos estabelecimentos, para impedir alemães de entrarem, bem como fornecedores. Depois, foram cassados direitos políticos e de propriedade dessas pessoas.


Outro exemplo é no Comunismo. Independente do país, via de regra, pessoas religiosas são perseguidas. Na União Soviética, as populações ligadas à Igreja Ortodoxa; em Cuba, os católicos presentes na ilha na época da Revolução Cubana; na China, as religiões tibetanas, missionários cristãos e muçulmanos; na Coréia do Norte, qualquer coisa que se coloque acima do mandatário estatal. Essas populações são perseguidas, vítimas de crimes humanitários e marginalizadas de participarem da vida em sociedade.


Tais exemplos são para demonstrar que populações quando são simplesmente ignoradas ou silenciadas de forma branda ou violenta, acabam gerando a situação de ruptura da ordem. Afinal, ter voz, parlar, não adianta quando não se é ouvido. E nesse sentido, os mecanismos de mídia são fundamentais para ouvir as diversas opiniões e pautas, sejam progressistas, conservadoras, liberais, protecionistas, etc. Para evitar a revolta daqueles que são alijados do processo democrático que não é apenas o ato do voto, mas também, o cotidiano do debate, do ouvir o contraditório.


O STF NÃO OUVE O CONTRADITÓRIO

Dentro da lógica de uma hegemonia, a esquerda tornou-se mal acostumada com críticas e questionamentos que não fossem mero jogo de cena. Assim, quando a direita sufocada ascendeu na segunda metade dos anos 2010, a irritabilidade, repulsa e sufocamento foram imediatas reações. Cabe lembrar que a maioria dos Ministros do STF foram colocados pelos sociais-democratas e petistas. Assim, a visão de mundo deles é a de que os limites de liberdades são aqueles impostos e mencionados pela academia (inundada por pessoas que leem Rousseau, Marx, Habermas, Gramsci, Chomsky, mas ignoram Burke, Kant, Oakeshott, Scruton, Sowell), e também por uma jurisprudência contaminada por decisões tomadas de visões esquerdistas.


Por isso que o STF não enxerga seus arroubos à liberdade no Brasil, quando abre inquérito sem passar pelo Ministério Público, ou quando manda prender sem que o inquérito seja concluído. Pois é a influência progressista do relativismo que atende em muito a visão esquerdista de mundo. A relativização de direitos como a liberdade encontra morada mesmo nas interpretações do art. 5º, e a falta de balizas sociais promovidas por movimentos como o pós-modernismo, possibilita que tudo seja passível de interpretação. Assim, encontra-se a proteção teórica e doutrinária, que foi usada por décadas para gerar a jurisprudência que propicie a decisão do juiz ser, literalmente, da sua cabeça, mesmo que em flagrante desrespeito a dispositivos legais.


  1. SARLET, Ingo Wolfgang; NETO, Jayme Weingartner. Liberdade de expressão: algumas ponderações em matéria penal à luz da Constituição Federal do Brasil. Espaço Jurídico: Journal of Law, v. 18, n. 3, p. 637-660, 2017.

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