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Guerra Híbrida: Se a arma não conquista, o dinheiro compra.

Continuando a série do SI, veja como o poder financeiro é usado como arma nos atuais conflitos híbridos mundo afora.

Esqueça o velho discurso do "imperalismo capitalista". Isso era o discurso socialista tentando antagonizar os Estados Unidos no séc. XX. Atualmente, esse poder financeiro, ironicamente é mais usado para escravizar e/ou vincular países aos interesses do Partido Comunista Chinês. No terceiro texto do Sociedade Inteligente sobre Guerra Híbrida, será demonstrado como a dependência financeira e econômica é usada como força coercitiva internacional, seja por países, seja por empresas transnacionais.


O exemplo mais notório desse tipo de dominação é visto na África. A China, ainda na década de 1990, lançou as bases para uma "cooperação" sino-africana através de uma estratégia de aproximação com os novos países independentes africanos. Essa "cooperação" deu o surgimento do termo cooperação Sul-Sul, mesmo desconsiderando a diferença colossal entre o "sul" chinês e o "sul" africano. Assim, conforme apontado por Madeira (2017)¹:

... o continente africano tem sido um dos mais beneficiados com a política de ajuda ao desenvolvimento, dado que já foram executados diversos programas, projetos e ações nos mais variados setores.

Ora, ao observar a fala, pode ser considerado que a China realizou uma ajuda sensata e um projeto de cooperação entre nações em desenvolvimento que deu certo. Contudo, o leitor não pode ser levado ao engano pela composição sintática da frase. Veja mais a frente no texto de Madeira, como é estabelecida a relação sino-africana:

A China tem procurado direcionar a sua atenção em áreas com potenciais de crescimento [na África] como sejam: educação, saúde, construção civil, serviços financeiros, bens de consumo e telecomunicações, assumindo assim uma posição de liderança ...

Observe que a China traz investimentos em áreas estratégicas dos países, áreas essas que as frágeis e pobres nações africanas não conseguiriam desenvolver sozinhas. Logo, por não conseguirem, aceitam os empréstimos ou a atuação direta das empreiteiras chinesas no patrocínio dessas obras. O ponto chave nessa relação é o retorno que tais países oferecem aos chineses.


A China na sua estratégia geopolítica global, para fazer frente ao poderio econômico dos Estados Unidos, tenta estabelecer rotas econômicas que não passem por regiões com aliados de Washington, ou países que sejam suscetíveis aos interesses da potência ocidental. Portanto, desenvolveu a chamada Iniciativa One Belt, One Road. Essa estratégia visa fechar a rota econômica que perpassa pelo litoral africano e integra a Europa e o Atlântico Norte ao Índico e ao Mar do Sul da China. Para isso, precisa ter ao seu lado os países africanos e ter acesso aos recursos desses países para explorá-los. Madeira explica:

A China certamente tem-se apoiado num plano de desenvolvimento interno, conforme estabelecido na Agenda 2063. Por terem manifestado o interesse, a China respondeu, pelo menos retoricamente, em favor da inclusão João Paulo Madeira 139 dos países africanos na iniciativa One Belt One Road. Sendo assim, os países africanos precisam de proporcionar a segurança adequada para proteger o ambiente de investimento.

Portanto, a ideia chinesa não é oferecer uma cooperação ingênua aos países africanos, mas sim estabelecer uma região geopolítica de influência e uma rota econômica. Essa, aliada com a rota pelo litoral ártico russo, fechará as possibilidades comerciais com a China, deixando os EUA somente com o acesso pelo Atlântico Norte ao Velho Continente, além de garantir o acesso chinês aos valiosos recursos minerais e naturais africanos.


Portanto, sem levantar armas, mas apenas com o poder econômico e a literal compra de apoios pela África, a China ganha terreno frente aos EUA, obtém acesso a recursos naturais e domina geopoliticamente uma região estratégica fundamental para os projetos chineses da Agenda 2063, que é tornar o país a nova superpotência global, desbancando a Pax Americana.


  1. MADEIRA, João Paulo. The Dragon Embraces Africa: Cape Verde-China Relations. Austral: Brazilian Journal of Strategy & International Relations, v. 6, n. 12, 2017.

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