Mais uma crise hídrica no país que possui a maior reserva de água doce do mundo. Uma série de erros governamentais nos trouxeram aqui, entenda.
Mais uma crise hídrica evidencia a falta de gestão pública de qualidade sobre um recurso tão valioso, a água. Falta de planejamento para os conhecidos períodos sazonais de seca, dependência extrema em energia por fonte hidráulica e a conhecida culpa da sociedade (que precisa ser apontada) são alguns fatores que nos trouxeram até aqui. A despeito de estarmos melhor preparados do que 2001 (época do racionamento de energia elétrica), hoje vivemos uma assustadora crise que pode sufocar o crescimento projetado para os próximos anos.
O planejamento é um dos pontos fracos da cultura brasileira. Mas um cidadão comum pode alegar isso ao se atrasar para um encontro, uma saída com os amigos, já o poder público é pago (e muito bem pago) para se planejar. No Brasil, via de regra, sabe-se que há a estação do verão chuvoso e a estação do inverno mais seco nas regiões onde ficam os principais reservatórios do país. Além disso, o governo possui mecanismos de detecção e prevenção como satélites, cientistas, especialistas, maquinário, etc. Tudo isso para evitar justamente o que se vive hoje: A falta de água.
E por que se afirma isso? Porque não é nem a primeira e nem a segunda vez que se observa uma crise de falta de água no Brasil. Em 2001, a pior crise já registrada até então levou o país a um racionamento forte de água e luz para repor os reservatórios das hidrelétricas. Em 2014, São Paulo teve quase o esgotamento completo do sistema Cantareira. Em 2017, o Distrito Federal teve problemas sérios também com esgotamento dos reservatórios. Em 2019, o Rio de Janeiro observou uma séria crise que contaminou a água que abastecia a capital carioca. Então a pergunta paira: Por que estamos vivendo isso novamente em 2021? Governantes sérios e bem assessorados, não preocupados unicamente com reeleições, tratariam o tema com mais atenção e ofereceriam todo o apoio necessário para resolução da questão.
Quando se observa também como é distribuída a matriz energética brasileira, a constatação é de que, assustadoramente, 70% da energia elétrica do país vem de usinas hidrelétricas. Uma equivocada opção ao longo das décadas finais do séc. XX que começa a cobrar seu preço. Não foi equivocado ter usinas como Itaipu, Furnas, etc. O erro está em depender tanto de uma fonte que possui fatores exógenos como clima e chuva. Há um mito no país que a ampliação da matriz para fontes como nucleares e eólicas seria caro demais ou poluiriam demais também. E o resultado está no atual encarecimento da conta de luz nas crises hídricas (cada vez mais frequentes), que demandam o uso das termoelétricas.
Sabe-se que pela geografia de planície, costa pouco acidentada e com formações que propiciam ventos nos períodos de início e fim de dia, o Nordeste possui um fantástico potencial eólico que poderia tirar tanto a dependência nacional nas hidrelétricas. Além disso, o know-how do Brasil no processo de fissão atômica e da purificação de combustível nuclear, podem tanto trazer ao Brasil benefícios estratégicos cruciais, como uma fonte de energia limpa e que não depende de fatores climáticos para funcionar. Finalmente, há também que ser levantada a contribuição que pode ser ofertada pelo potencial solar do país que tem radiação da nossa estrela em metade do dia na maior parte do território.
Outro fator preponderante na questão hídrica é o comportamento da sociedade e como lida-se com a água no Brasil. Ninguém fala, mas é pensamento de todos que o recurso no Brasil pode ser esbanjado e agimos como se nunca fosse possível acabar a água um dia. É muito comum ver donas de casa lavando calçadas e garagens com mangueiras, aí pegam uma vassoura para esfregar e limpar, deixando a mangueira ligada. Outra cena comum são as péssimas obras de redes pluviais que por vezes estouram jorrando milhares de litros de água, desperdício em órgãos públicos e até o simples ato de deixar a torneira da pia ligada enquanto lava as louças. Parece que a água no Brasil não tem fim.
Não apenas a má educação nessas atitudes, mas principalmente a forma como tratamos nossos rios, jogando esgoto sem tratamento, lixo e mais lixo nas encostas de igarapés e riachos urbanos, lagos que nem existem mais e revelam entulhos, tudo fruto de anos e anos da falta de consideração com o bem de que mais precisamos para viver. E não deve-se considerar como "lacração ambiental", pois é uma pura e simples questão de higiene, conservação de recurso e inteligência que todos possuem para saber que, se a água não for tratada de forma séria, um dia acabará.
Por isso vivemos mais uma crise hídrica. Uma mistura de má gestão, péssimas políticas públicas de manejo de recursos hídricos, falta de saneamento, falta de compreensão das sazonalidades envolvidas em sistemas hidrelétricos, e a alta dependência hidráulica da matriz energética. Há solução, mas o maior problema a ser enfrentado no caso é a vontade política que, geralmente não vem sem um "empurrãozinho" ($$$), ou também a falta de conhecimento das pessoas para preservarem os recursos hídricos que não são infinitos.
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